quarta-feira, junho 17

OLD CESAR E FRANK VEGAS

Old Cesar

Meu tio Frank Vegas entornou uma garrafa inteira de Vat 69 num mês de maio qualquer, não lembro a data. Cachaças o deixavam enlouquecido e várias centenas de pessoas podiam ser desacatadas na rua por ele, civis ou não. Meu tio empunhava o termômetro do limite entre a loucura e o discernimento, fora sua qualidade e ampla incoerência em relação à sua sensualidade e desinibição com as mulheres, em especial, àquelas dominadas por espíritos de antigos ancentrais de matas beiras de rio.

Naquele tempo eu não entendia muito suas atitudes tribais, mas o que ocorria, era uma metamorfose sutil com meu tio. Eu era muito pequena e ficava olhando de soslaio para que ele não percebesse que o via. Mas ele sempre sabia que eu o observava...

Segundio o tio, a "água que pega fogo" era invenção dos demoníacos gregos que em dias de festas e orgias loucas sorviam a bebida que fora mastigada por um velho no auge da loucura e demência e assim, nestes "festivus" se declarava toda e qualquer forma de loucura e perda completa dos sentidos. Meu tio dizia que poderia ser o caos da humanidade se entupir destas coisas e acontece que ele mesmo não conseguia resistir à tentação quase "opiosa" de tomar uma cachacinha vagabunda pra se sentir poderoso e poder revidar qualquer pensamento aguardado em aguardente em quem ele desejasse no momento.

Meu tio eclético, viajado e muito nobre, sempre acostumado à várias regalias da vida por conta de sua beleza e virilidade ganhava muitas garrafas de vinhos caríssimos, garrafas de sidras e garrafas de brandy. Porém o que seduzia meu tio eram aquelas garrafas mal feitas e reaproveitadas onde os índios mascadores de milho cuspiam matéria-prima pra fazer as tradicionais cachaças pagãs que os esquentavam quando o caía sobre a mata o frio avassalador daquela eterna guerra fria que era sobreviver.

Ele se seduzia e colecionava garrafas de vários tamanhos e as usava como objeto de delírio e espelho da sua loucura. Tio Vegas, lembram? Colecionava lenços umedecidos com pontas de batom de qualquer dama que esquecesse sobre a mesa, tio Vegas aquele indecente colecionador de revistas antigas de mulheres pulando cercas pra brincarem com animais. Tio Vegas havia a pouco tempo estava à beira da loucura com seus binóculos prateados ensaiando falas de James Bond pra qualquer estranha que pasasse. Um dia meu Tio se enrabichou de vez por uma sueca peituda de olhos mareados e foi com ela pra um hotel na Friederischstrasse, em Berlin. Fiquei anos sem ver meu "árabe "Al Kuhul"...minha doença de fígado e sofri sua falta compensando minha vida pulando de barco em barco e por uma coicidência nefasta bebi um gole daquela bebida antiga índigena e vomitei meus pecados de ter que viver sem sua sombra e sua proteção...Meu tio era a própria máfia siciliana. Guardava um punhal perto da cinta e simplesmente deixava eu brincar com a lâmina de prata e muitas vezes me cortei o sangue jorrou na face e to dizia: - basta lamber que ele volta pra dentro...

Tio Vegas, outro dia bebi desta bebida nefasta e causei um estranho enorme, um acidente de carro, a perda da consciência política e esqueci quem era o candidato à presidência. Sentei com estranhos em um lugar friorento e comi omelete vegetariano perto do meio-dia sentindo golfadas de culpa cristã por sentir estes sentimentos embaralhados em minha própria infantilidade.

Tio quando cometemos aquela loucura de causar incesto na beira de uma estrada vazia foi quando me deparei com a sombra do brilho dos seus óculos Ray-Ban mergulhados na gordura da oleosidade da sua face morena, percebi. Sua melhor amiga era eu e você tinha esquecido disso quando passou a usar camisas floridas e praticar polo com os yuppies gays daquela província e falar amontoados de consoantes sem sentidos.

Porra! Caralho! Você é tão fodido que nem me deixou uma lembrança da sua língua nativa naquele copo de café aguado naquela fria tarde entediante e pensei: "meu tio morreu pra mim e agora"

Meu tio quer ver uma pernambucana, quer beber e sorver da vodka indígena dos meus pecados e depois deleitar-se na sua praticidade em estocar comida pro inverno. Cheddar! Cheddar! Nem conseguia mais comer aquele queijo duro porque tio Vegas me deixou de legado pacotes de cheddar vencido e aquela garrafa empoeirada de Old Cesar ainda reside dentro da minha gaveta de meias de verão. Tio Old, você é um velho cômico que tirou um pedaço da minha sobriedade e me trouxe de novo aquela velha vertigem no desejo de te esperar pegar aquele bote antigo e mudar a direção dos ventos ao velejar dos pássaros ansiosos por peixes podres nas marinhas....sol entardecer...frio de doer, Tio Vegas sabe o que pode e o que não deve mexer.

Tio Frank, o avanço da ciência numa borra de glicose etílica...

"...sua sobriedade é igualmente notável em relação à bebida alcoólica, embora isso se aplique menos as classes inferiores, para as quais na verdade, os vinhos generosos e a aguardente de cana são necessários até certo ponto, pois de outro modo, os alimentos pesados, que constituem sua alimentação principal, mandioca, milho, feijão e carne seca salgada lhes seriam nocivos. Raramente se encontram bêbados, mesmo entre os brasileiros (brancos nascidos no Brasil) da mais baixa categoria, tais excessos são mais frequentes entre negros e índios"... (RUGENDAS)

DO LIVRO MEU TIO FRANK VEGAS
BY SUZANNE VEGAS